(texto tirado e adaptado de http://www.naturlink.pt/canais/Artigo.asp?iArtigo=2011&iLingua=1)
Portugal é o maior produtor mundial de cortiça. Este material,
para além da sua grande quantidade de utilizações, é obtido
de uma árvore (o sobreiro) e de um sistema (o montado) que têm
uma excepcional importância ecológica.
Cristina Pereira
Na Expo 2000 de Hannover a cortiça, a pedra de lioz e
o azulejo foram
os materiais escolhidos para a construção e ornamentação
do Pavilhão de Portugal. O tema desta exposição – “Humanidade,
Natureza e Tecnologia” – relaciona-se com este material, 100% natural,
reciclável e símbolo de algumas das paisagens mais características
do nosso país.
Portugal tem no sector corticeiro uma oportunidade de brilhar, uma vez que
somos mundialmente o maior produtor e transformador industrial de cortiça.
Mas como se forma este produto, como se processa o seu crescimento e quais
as propriedades que o tornam tão importante?
O sobreiro (Quercus suber) é a única espécie florestal
do mundo produtora de cortiça com capacidade para utilização
industrial, pois todas as outras produzem cortiça (ou tecido suberoso)
mas com características completamente diferentes.
Apesar da concorrência das rolhas de plástico e do “gosto” que
por vezes a cortiça parece transmitir ao vinho, os melhores produtores
vinícolas apostam na utilização de cortiça pois
as suas propriedades de impermeabilidade, leveza e “estanquicidade”conferem ao
seu produto as melhores garantias de qualidade. A primeira cortiça
a ser formada designa-se por cortiça virgem, que apresenta uma estrutura
bastante irregular, sendo utilizada maioritariamente para artigos decorativos. É a
cortiça extraída em sobreiros com uma idade normalmente próxima
ou superior a 40 anos que constitui a base da transformação industrial.
Esta cortiça apresenta características muito particulares, possuindo
elevada elasticidade, compressibilidade, imputrescibilidade,
capacidade de isolamento, baixa densidade e fraca permeabilidade.
A época de descortiçamento vai geralmente de Julho a Setembro.
Por imposição legal o descortiçamento só pode ser
feito de 9 em 9 anos e quando o sobreiro apresenta um perímetro do tronco
superior a 70 cm. A cortiça é retirada em pranchas, pedaços
de cortiça com altura superior a 1 m e largura a rondar os 40 cm, dependendo
do tamanho do sobreiro e do local – tronco ou ramos – de tirada
da cortiça. Esta operação, pelos danos que produz na árvore,
necessita de cuidados especiais para não a afectar gravemente e comprometer
a produção seguinte de cortiça. Após a retirada
da árvore, a cortiça é colocada em pilhas e
fica em “descanso” durante
aproximadamente seis meses, altura em que se inicia a sua transformação
tecnológica.
Se perguntar a idade a uma senhora ainda é sinal de indelicadeza, averiguar a
idade de uma prancha de cortiça é uma operação rotineira.
Após ler os próximos parágrafos vai conseguir
fazê-lo facilmente. Quanto a descobrir a idade da senhora, isso continuará a
ser um daqueles mistérios da vida.
No sobreiro, o ciclo anual de crescimento da cortiça compreende duas
fases: a de actividade vegetativa, que vai da Primavera ao fim do Outono, e
a de repouso invernal, que se prolonga pelos meses de Novembro a Fevereiro.
O repouso invernal pode ser mais ou menos longo consoante as
condições
ambientais.
Na primeira fase distinguem-se dois períodos: o primaveril, de crescimento
mais activo, correspondendo a 2/3 do crescimento suberoso (da cortiça)
anual, nos meses de Março, Abril, Maio e Junho, e o período estivo-outonal
em que a intensidade do crescimento é bastante menor e que se prolonga
por Julho, Agosto, Setembro e Outubro. A estes dois períodos de crescimento
correspondem dois tipos de células diferentes, as de Primavera maiores
e com paredes mais finas e as de Outono mais pequenas e com uma maior espessura
da parede. O aumento gradual da espessura das paredes e as menores dimensões
das células produzidas no Outono originam diferentes colorações
na prancha que permitem delimitar as sucessivas camadas anuais correspondendo
os anéis mais escuros a este período.
Considera-se como crescimento completo o resultante da fase de actividade
vegetativa, compreendendo tecidos formados na Primavera e tecidos formados
no Verão e Outono. Todo o crescimento que não apresenta células
de ambos os tipos é um crescimento incompleto, e compreende dois períodos
distintos, um que vai desde a tirada da cortiça até ao momento
em que cessa a actividade vegetativa e a árvore entra no período
de repouso invernal e o outro que vai desde o início da actividade vegetativa
até à tiragem da cortiça no fim do ciclo produtivo.
No primeiro período de crescimento incompleto produz-se uma camada delgada de
tecido suberoso, caracterizada pela presença exclusiva de células
de Verão e de Outono, cuja espessura varia consoante a intensidade de
crescimento da árvore, o momento da tirada e o início do período
de repouso. A este estrato suberoso falta-lhe a parte formada durante a Primavera,
que ficou aderente à prancha no momento da tirada. O segundo período
de crescimento incompleto compreende apenas as células de três
a quatro meses formadas durante a Primavera, sendo a sua espessura variável
consoante o início da actividade vegetativa e o momento da tirada.
A determinação da idade é feita com base nos crescimentos
completos, correspondentes a um ano, e incompletos, correspondentes a ½ ano.
Para sabermos a idade da cortiça temos que acrescentar ao número
de camadas anuais completas mais um ano, que representa a soma dos dois ½ anos.
Como dizia já há algumas décadas o nosso maior estudioso da cortiça Vieira Natividade: “A nossa riqueza corticeira não é saco sem fundo. Urge proteger eficazmente os sobreirais, se não queremos que esta grande riqueza, que nos dá no mundo tão invejada posição, passe a ser mais uma das glórias do passado, um dos tantos bens que tivemos nas mãos e deixámos perder como incorrigíveis perdulários”.